A certa altura, durante o visionamento do Tudo Pode Dar Certo do Woody Allen, toda a sala se empolga em monumental gargalhada. Na cena em causa, um ultra-conservador cavalheiro do Sul, apercebe-se da sua homosexualidade reprimida em conversa com um alegre Nova Iorquino, saído directamente do Sexo e a Cidade. É preciso, em primeiro lugar, entender que nos filmes do Woody Allen, existe apenas uma personagem, a sua. O resto dos bonecos que compoem o enquadramento não passam disso mesmo: figuras bidimensionais, estereotipadas, que servem na definição da personagem principal ou no propósito burlesco. Isto tem piada. Mas não foi o factor risível desta construção aparentemente primária que despolotou a reacção. Foi um equívoco, outra coisa que não está ali. Foi o sentimento-vida-moderna-urbana de quem vai ao ginásio (obrigado Francisco pela imagem certeira) e está a par ou compreende a coisa. De quem já topou o que vai dentro de um origami. Desta espécie de holograma do Rhett Buttler. É um estava-se mesmo a ver tão óbvio quanto infantil. Sorte de contentamento ou alívio perante o desconforto da figura ultrapassada. Ah bom, afinal é como nós.
Vi a Fernanda Cãncio entrar para a sala de cinema, não faço ideia se participou ou não da catarse que aqui descrevo.